A estiagem que atinge estados do Sul aliada às altas temperaturas, pode gerar dificuldade na produção agropecuária e no abastecimento de água no meio rural. Diante deste cenário, técnicos da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de SC (Epagri) listaram informações e tecnologias para colaborar com produtores rurais e outros profissionais do meio no enfrentamento destes desafios.
A Empresa também acompanha a evolução do cenário para promover, sempre que necessário, a operacionalização de políticas públicas que possibilitam mitigar os problemas e danos ocasionados pela restrição hídrica em cultivos agrícolas, produções pecuárias e abastecimento de famílias no meio rural.
A recomendação principal para as famílias agricultoras catarinenses é procurar os escritórios da Epagri em Santa Catarina quando necessário.
Água
- Identifique os pontos de captação e armazenamento de água na propriedade. Há diferentes maneiras de percebermos a água nas propriedades rurais. São águas de chuva, de nascentes, córregos e lagos, de poços (cacimbas ou artesianos). A conservação, o armazenamento, o uso racional e o saneamento são fundamentais para gestão da água, sobretudo em época de estiagem.
- Aumente a capacidade de armazenamento de água no solo. Controle a erosão para aproveitar o máximo da água da chuva. Proteja áreas de nascente e córregos, iniciando com isolamento da área e favorecimento de crescimento da vegetação. Esta ação funciona como uma barreira física, segurando os sedimentos que podem assorear as nascentes e córregos.
- Cultive utilizando o sistema plantio direto. Evite mobilizar o solo. Mantenha permanentemente o solo com cobertura viva ou palhas. Realize a rotação de culturas e diversifique os cultivos no ano. Reduza o intervalo de tempo entre colheita e semeadura.
- Realize o cultivo em contorno, em faixas, com terraceamento. Essas práticas favorecem a retenção de água no momento da enxurrada e aumentam a quantidade de água disponível para as plantas.
- Conheça os Programas “Kit Solo Saudável” e “Cultivando água e protegendo solo”. São políticas públicas viabilizadas pela Secretaria da Agricultura, da Pesca e do Desenvolvimento Rural. Estes Programas fornecem subsídios aos agricultores, com enquadramento para aquisição de sementes de adubos verdes, proteção e recuperação de nascentes, terraceamento, captação, armazenamento e distribuição de água nas propriedades rurais. Para saber mais sobre os Programas, procure o escritório da Epagri em seu município.
- Invista em armazenamento de água. Neste momento crítico, onde há locais com restrição na disponibilidade de água, é preciso ser eficiente para reter ao máximo a água da chuva nas propriedades rurais.
Capte a água da chuva que cai sobre as construções da sua propriedade, armazenando-a em reservatórios e cisternas. É a forma mais barata e eficiente de aumentar a reserva de água na propriedade. Invista em reservatórios grandes que garantam estabilidade produtiva, principalmente na produção animal. Poços artesianos podem ser opções complementares, mas suas construções devem ser feitas sob orientação de profissionais habilitados e com critérios técnicos. - Fique atento ao uso consciente e racional da água na propriedade rural. Evite desperdícios: feche torneiras que estejam pingando, arrume os encanamentos, não deixe a água extravasar à vontade nos bebedouros dos animais, realize práticas de manejo animal com o mínimo de água possível. Não lave o carro e calçadas de casas de forma desnecessária. É preciso economizar água sempre que possível.
- Economize água na Irrigação. Conheça a necessidade de água do seu cultivo, estabeleça rotina para verificar vazamentos nas tubulações, nos equipamentos de captação e distribuição de água. Cada litro de água desperdiçado custa muito caro para todos.
- Manter a qualidade da água é fundamental. O saneamento com a coleta e tratamento de resíduos líquidos (esgotos, efluentes domésticos e resíduos de atividades produtivas) evita a contaminação do lençol freático e de corpos d’água de superfície.
Para isso, utilize tecnologias como:
– Proteção de Fonte Modelo Caxambu: sistema de baixo custo e alta eficiência na proteção de nascente, garantindo a qualidade de água a ser fornecida para humanos e animais.
– Filtros lentos: melhora a qualidade de água disponível na propriedade.
– Esterqueiras e biodigestores: Captam e tratam os dejetos dos animais, permitindo o uso como fertilizantes de forma segura, diminuindo a contaminação de águas de córregos e nascentes, além de diminuir os custos de produção das lavouras.
Grãos
- Realizar avaliação da qualidade física do solo (perfil cultural), especialmente compactação e adensamento e, se necessário, entrar com medidas corretivas, como descompactação mecânica (escarificação), seguida de semeadura de culturas com sistema radicular bem desenvolvido.
- Utilizar sistema de rotação de culturas para proporcionar o maior período de cobertura do solo com plantas vivas, com aporte de palhada superficial para proteção do solo.
- Implantar práticas mecânicas de conservação do solo e da água, como terraços e curvas de nível, para promover a absorção da água na lavoura, para evitar o escoamento da água para fora da área.
- Realizar a análise química e física do solo e, se necessário, corrigir a fertilidade do solo em profundidade, visando infiltração de água e aprofundamento de raízes das plantas.
- Utilizar o Sistema de Semeadura Direta, com mínimo revolvimento, monitorando as áreas para que tenham massa suficiente de palhada. Lavouras com acúmulo anual de massa seca acima de 10 toneladas por hectare toleram maiores períodos de redução na disponibilidade de água no solo.
- Desenvolver um programa de irrigação aos produtores de milho para fins de silagem, testar modelos de irrigação (além da aspersão). Utilizar as políticas públicas existentes na SAR para fomentar/subvencionar módulos de irrigação de até 3 hectares para pequenos produtores. Isto poderia garantir a produção de no mínimo 150 toneladas de silagem em cada propriedade, garantindo a manutenção de mais de 30 vacas por ano (junto com pastagens nativas), ou seja, a manutenção da propriedade com uma renda mínima
Arroz irrigado
Nestes cultivos, embora sendo irrigada, a cultura também está sujeita aos efeitos da estiagem. Temperaturas superiores a 35ºC / 38ºC na diferenciação do primórdio floral e antese, bem como na emergência da panícula, elevam o percentual de esterilidade, resultando em falhas de grãos. Para otimizar o uso da água de irrigação, recomenda-se as seguintes práticas:
- No caso de ocorrência de ondas de temperaturas acima do normal, uma elevação do nível da água atenua o problema, pois a água tem um efeito termorregulador.
- Manejar as quadras com lâmina permanente de água.
- Ampliar a capacidade de armazenamento da água na propriedade.
- Readequar sistemas de captação e condução coletivos/individuais da água para irrigação.
- Na entressafra, reforçar as taipas, tanto na altura quanto na largura, sistematizar o solo para melhorar a distribuição da água.
- Aproveitar as épocas mais chuvosas para armazenamento de água.
Milho
O déficit hídrico em consequência de estiagem, associado à elevadas temperaturas, aumentam a evapotranspiração das plantas. As fases mais críticas coincidem com o pendoamento (polinização) e enchimento de grãos. Neste caso, temperaturas acima de 33ºC reduzem sensivelmente a germinação do grão de pólen, causando esterilidade e resultando em espigas com menos número de grãos.
- O milho cultivado em sistema em semeadura direta com camada adequada de palha no solo (cobertura do solo), pode atenuar o problema das altas temperaturas, pois reduz a temperatura do solo e as perdas de água.
- Agricultores que cultivam milho para silagem devem ficar atentos para o ponto adequado de corte das plantas, associado à condição de disponibilidade de água no solo.
- Utilizar cultivares que apresentem tolerância relativa a estiagens, verificar avaliações em Valor de Cultivo e Uso e recomendações e características do germoplasma.
- Os cultivares desenvolvidos pela Epagri e híbridos duplos possuem maior base e variabilidade genética, além de maior espaço de tempo de florescimento, isso pode se constituir tolerância a períodos curtos de estiagem.
- Em épocas e previsões da ocorrência do fenômeno La Niña, utilizar densidades de plantio maiores, com estandes menores daqueles recomendados para os cultivares.
- Utilizar escalonamento de plantio nas diferentes glebas, isto garante uma maior probabilidade de “escapar” do período crítico da estiagem e garantir uma produção mínima satisfatória.
Soja
A associação de restrição da disponibilidade de água no solo e alta temperatura pode ocasionar encurtamento do ciclo da cultura, afetando a produtividade das lavouras. Temperaturas acima dos 40ºC podem paralisar o desenvolvimento e abortar flores. Quanto mais avançado o estágio de desenvolvimento da cultura, menor é a tolerância à altas temperaturas e deficiência hídrica.
- Atentar para o fato de que cultivares superprecoces apresentam maior risco de serem afetados por estiagens e redução da produtividade.
- A rotação trigo-soja é natural, pois o trigo fornece um volume de palhada adequada para plantio direto e tem sua colheita em outubro, quando se dá a janela ideal para plantio da soja. Porém, cada região tem sua característica e sistemas de rotação mais adequados.
Feijão
Escassez de água e temperaturas acima de 35ºC são prejudiciais ao feijoeiro se coincidir com a fase de florada, provocando o abortamento de flores. As lavouras da safrinha poderão ter problemas também na fase de germinação e estabelecimento de plantas, caso as altas temperaturas vierem acompanhadas de estiagem e o solo com as reservas hídricas comprometidas.
- Atrasar alguns dias a semeadura da safrinha pode atenuar o problema inicial, entretanto, poderá ter problemas com geadas precoces. Importante sempre respeitar o período de semeadura, de acordo com o zoneamento para a cultura.
- Avaliar utilizar os cultivares mais tolerantes à estiagens. Para saber mais, procure a Epagri de seu municípios.
Olericultura
Os cultivos mais sensíveis neste período do ano são as hortaliças folhosas, como alface, rúcula e temperos verdes. Também cucurbitáceas como abóboras e morangas, solanáceas como tomates e pimentão, brássicas como repolho, couves, brócolis e couve flor. Nas regiões mais quentes do Estado, principalmente no Litoral, Oeste e Extremo Oeste e Vale do Rio Uruguai, a radiação solar excessiva e o calor podem afetar cultivos mais suscetíveis. Tudo isso é agravado com a restrição de água no solo.
Como indicação, seguem algumas possibilidades que associadas podem colaborar para mitigar os efeitos da estiagem associados a alta temperatura:
- Uso do sistema plantio direto de hortaliças (SPDH). Esta é uma ótima estratégia para enfrentamento da estiagem e estresse pelo calor. Para isso, há necessidade de planejamento e aprimoramento na execução, principalmente no uso de plantas de cobertura de solo de boa qualidade e em quantidade adequada de palhada que amenizam altas temperaturas e reduzem as perdas de água.
- Escolha de cultivares tolerantes. Cultivares com maior tolerância a elevadas temperaturas, principalmente nos cultivos de folhosas e em brássicas, podem oferecer melhor resposta ao florescimento antecipado e desenvolvimento das plantas.
- Telas de cobertura. O uso de telas refletoras, que promovem o sombreamento artificial, podem auxiliar na mitigação do calor. Atenção ao nível de sombreamento, que não deve exceder 50% em cultivos comerciais, devido à possibilidade de ocasionar estiolamento das plantas.
- Irrigação. Nas situações em que a umidade do solo está reduzida, o uso de irrigação complementar é essencial. Em altas temperaturas, a irrigação, além de repor a água, pode favorecer o arrefecimento das plantas, reduzindo o estresse. É importante verificar a capacidade de armazenamento de água, escolha do método de irrigação e uso adequado da água irrigada. O volume de água, o método e o momento da irrigação são fundamentais para obter o efeito desejado. O uso de métodos de irrigação por aspersão colaboram para amenizar a temperatura ambiente e do solo. A irrigação deve ser utilizada de forma antecipada, em horários que antecedem as horas mais quentes do dia, e perdurar por período que ofereça condições de enfrentamento do calor.
- No plantio das mudas. Executar essa atividade em horários mais amenos do dia ou ao entardecer e cuidar para que o solo tenha umidade suficiente ou irrigar para garantir a pega das mudas. Também é recomendável o uso de mudas de qualidade, bem formadas e no ponto certo de transplantio, para garantir o pegamento e desenvolvimento das plantas. Importante o uso de cobertura de telas, pode ser uma opção, quando possível.
Para os cultivos em abrigos
– Uso de microaspersores para nebulizar o ambiente no período de altas temperaturas.
– Manejo e abertura das telas laterais para facilitar a circulação do ar.
– Possibilidade em cobrir os abrigos com telas
Fruticultura
Neste período, a menor precipitação poderá influenciar no desenvolvimento de frutos em pomares de macieiras, videiras, ameixas, maracujá e banana. Seguem algumas indicações:
- Intensificar práticas de proteção e conservação do solo, das nascentes e dos cursos de água.
- Avaliar a viabilidade em implantar/ampliar a reserva de água da propriedade e sistema de irrigação. Priorizar sistemas de irrigação por gotejamento que otimizam o uso da água.
- Manter a cobertura de solo, manejado com roçada.
Autores
Carlos O. M. Fernandes – Coord. do Programa Pecuária
Darlan R. Marchesi, Gerente DERP
Donato Lucietti – Coord. do Programa Grãos
Everton G. D. Giustina –Coord. do Programa Aquicultura e Pesca
Juliane G. K. Justen –Coord. do Programa Desenvolv. e Sustentabilidade Ambiental
Marcia da R. Gomes – Coord. do Programa Capital Humano e Social
Paulo Francisco da Silva – Coord. do Programa Olericultura
Rodrigo Durieux da Cunha –Divisão de Estudos Apícolas
Sergio N. da Veiga – Coord. do Programa Fruticultura