Coluna Na Varanda, escrita pelo economista e consultor internacional, Francisco Vila.
Torna-se mais fácil compreender porque jovens profissionais, geralmente bem formados, buscam atividades no interior. Lá, perto da família e dos amigos da escola, existe uma demanda crescente por sucessores ou por consultores
Estamos na época do ano em que as famílias se reúnem. Mais do que no passado, são assuntos sérios que, hoje, marcam as conversas entre pais e filhos, irmãos e primos e com os amigos da escola que nos cumprimentam no Natal e na passagem do ano. A guerra na Europa continuará por quanto tempo? Vai ter uma nova onda de pandemia? E, sim, com qual grau de isolamento? Qual pode ser o impacto das políticas do novo governo no crescimento da economia e no câmbio? O consumidor voltará a comprar nossa carne no nível tradicional? Enquanto o custo parece crescer sempre, até onde os preços no supermercado podem acompanhar essa tendência? O crescimento da exportação será capaz de compensar a menor demanda interna? E, provavelmente, o assunto mais discutido: como a explosão de tecnologias, em todas as frentes do processo produtivo dos alimentos, vai impactar no agro e, especificamente, no dia a dia da nossa fazenda?
Bom, sabemos que para a maioria das questões não existem respostas claras. Mas temos que trabalhar com hipóteses, pois o conjunto de todas essas tendências mudará o ‘o quê’ e o ‘como’ daquilo que fazemos na nossa propriedade. Um aspecto ainda pouco debatido é o provável retorno de muitos jovens ao interior. Não se trata somente de trocar altos aluguéis nem exorbitantes preços de almoços e de jantares fora da casa pelo simpático ambiente da família no campo. Isso certamente vai ocorrer. Mas, o principal motivo da crescente mudança das metrópoles para as cidades de menor dimensão é a perspectiva da chamada ‘empregabilidade’.
Leia também: Carne bovina: Precisamos mexer no preço!
Nas conversas com os familiares, convém avaliar um pouco o novo sentido desse termo que sempre usamos apenas numa das suas funções: quando falamos de funcionários. Pois todos nós empregamos esforços para alcançar metas que costumamos definir no início de cada ano. Assim, tanto o empregador como o empregado operam num contexto maior da capacidade de empregabilidade. E isso é importante entender. Muitas das novas tecnologias, que surgem quase diariamente, terão reflexos na maneira como nós trabalhamos, sendo dono, gerente ou tratorista.
Uma boa oportunidade para enxergar as perspectivas da crescente automação é visitar concessionárias de máquinas e equipamentos rurais. É impressionante (para não dizer assustador ou preocupante) observar como um operador está cercado por telas e usando um joystick ou um teclado para regular a pressão de um pneu ou informar o manobrista da colheitadeira – a mais de mil quilômetros de distância – sobre o que está acontecendo com seu equipamento. Na pecuária, não é muito diferente. Um conjunto de chips em localizações estratégicas do corpo dos animais pode informar o dono, em sua sala com ar condicionado, sobre a sensação de calor, fome ou sede da vaca, para ele possa, assim, organizar soluções individualizadas para o manejo.
Com esse cenário, torna-se mais fácil compreender porque jovens profissionais, geralmente bem formados, buscam atividades no interior. Lá, perto da família e dos amigos da escola, existe uma demanda crescente por sucessores ou por consultores que dominam o conjunto dos sistemas tecnológicos que começa com novas soluções da inseminação, passando por aplicativos de pesagem por raio laser e envolvendo também a gestão do manejo por drones a partir de qualquer lugar do país. Ou seja, temos aqui no campo um atrativo para jovens que gostam de combinar seus talentos em resolver processos complexos com a incontestavelmente maior qualidade de vida a céu aberto. O êxodo rural inverte-se e se transforma na fuga do estresse urbano. E, quem já está no campo, não só trabalha no melhor setor da economia como aproveita com maior consciência essa vida que é o sonho do pessoal da cidade. Boas conversas no final do ano!