Coluna Na Varanda, escrita por Francisco Vila, economista e consultor internacional
A Embrapa está celebrando 50 anos de um trabalho que mudou o agro do Brasil. Temos a sorte de ainda podermos contar com pensamentos e iniciativas das principais personalidades que construíram o milagre que transformou o país de importador para o maior exportador de alimentos dentro de duas gerações. Tanto os ministros Alysson Paolinelli, como Roberto Rodrigues e Tereza Cristina continuam a orientar os eixos mestres da evolução do setor. Assim, parece normal e oportuno ampliar a visão da atualidade para o horizonte de 2050.
Numa publicação de 120 páginas (“O futuro da agricultura brasileira: 10 visões”), com contribuições de vários autores, a Embrapa convida para acompanhar múltiplos horizontes de médio e longo prazo. Vale a pena acessar o PDF do livro no site da instituição. Sabemos que tudo muda o tempo todo e, cada vez mais, com maior velocidade. Diante dessa realidade, convém questionar a nossa capacidade real para concretizar o exercício de antecipar o futuro. Somente olhando para os saltos qualitativos e quantitativos que a agropecuária conseguiu realizar nesses 50 anos, e tentando enxergar direções e velocidades da evolução de todas as tecnologias na cadeia de valor dos alimentos, podemos facilmente perder o entusiasmo de pensar 10, 20 ou 30 anos em frente.
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Em recente reportagem sobre a visita do chefe do governo de Israel ao instituto de pesquisa Steakholder Foods, foram apresentadas as máquinas pós-3D capazes de produzir toneladas de carne artificial por dia com qualidade e sabor capazes de confundir o consumidor sobre a origem do produto. Porém, como já aprofundado em conversas anteriores, não devemos nos preocupar com essa tendência, pois a demanda global crescerá o suficiente para permitir a coexistência dessas duas carnes concorrentes, inclusive prevendo um crescimento anual da carne bovina de 2 a 3% ao longo das próximas décadas.
O perigo não surge do lado da demanda, mas, sim, dos custos da produção.
Como aprendemos com a evolução dos preços de outros segmentos como carros, vestuário ou smartphones, a produção industrial gera economias de escala que podem ser passadas para os preços ao consumidor. No caso do boi, que conta com um ciclo longo de 5 anos, entre avanços genéticos e abate dos animais, o aumento de produtividade tem limites naturais. Enquanto processos industriais são muito menos complexos do que produções a céu aberto e com impactos externos incontroláveis, como custos de insumos ou desafios de logística, a transformação de células-tronco em alimentos possui a vantagem de uma menor dependência de outros fatores do mercado.
No entanto, como todos concordam, sempre haverá um grande número de pessoas que prefere aquela carne de boi que saboreamos há séculos. Porém, olhando para a evolução dos preços da picanha ao consumidor, em torno de 100 R$/kg, nossa carne se tornou cada vez mais um ‘produto de luxo’. Se analisarmos a evolução do preço da arroba ao longo dos últimos anos, com pico de 345 R$/@ em março de 2022(naquela altura com a expectativa de ultrapassar a marca de 370 R$/@), podemos constatar que, mesmo com aumento dos custos de produção, a média do valor da arroba dos últimos meses oscila de 15% a 20% abaixo daqueles já recebidos no passado. A redução do consumo per capita, no Brasil, é outro sinal para o pecuarista focar cada vez mais na incorporação de novas tecnologias, modernas opções de gestão e comercialização (cooperativas) e intensificação da colaboração entre pais e filhos na gestão do negócio do boi. Se o teto do preço, no supermercado, obriga a controlar melhor o custo na fazenda para assegurar uma margem aceitável, toda a atenção deve se concentrar na otimização dos processos. E essa é a área onde a experiência do dono precisa ser ampliada pelo conhecimento e pela aplicação das novas tecnologias que surgem todos os dias.