Coluna Agricultura 4.0, escrita pelo professor da Fatec e Pesquisador do Laboratório de Monitoramento e Proteção de Plantas – LMPP, Carlos Otoboni.
A precisão em proteção de plantas é um tema que precisamos discutir mais, visto que a tecnologia para a agricultura avançou rapidamente e as recomendações agronômicas para isso caminham a passos de tartaruga.
Bom, algumas pesquisas demonstram que até 98% dos inseticidas e 95% dos herbicidas nas pulverizações atuais são depositados em um local diferente de seu alvo, que seriam, respectivamente, os insetos e as plantas daninhas. Parece absurdo, mas é relativamente fácil entender esses números uma vez que, ao se fazer uma aplicação de inseticida para controlar um percevejo na soja, o alvo é a planta e não a praga, ou seja, damos um banho de inseticida na planta para controlar um alvo que é centenas de vezes menor que planta de soja.
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Muitas plantas e áreas do talhão ainda recebem o inseticida sem a ocorrência da praga e parte dessa pulverização é perdida na forma de deriva ou simplesmente é depositada no solo. Assim, vem a pergunta: será que não dá para errar somente 50% ou menos?
Algumas pesquisas demonstram que até 98% dos inseticidas e 95% dos herbicidas nas pulverizações atuais são depositados em um local diferente de seu alvo
O fato é que dados como esses são difíceis de achar na literatura, porém são óbvios pela analogia feita. Parece que existe uma resistência de todos os envolvidos em fitossanidade e tecnologia de aplicação em debater esse tema. Talvez pela própria limitação da tecnologia, desconhecimento do alvo e de técnicas de monitoramento, ou mesmo por motivos não tão nobres, como interesses comerciais na venda de defensivos.
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Do ponto de vista da tecnologia, para manejos fitossanitários mais precisos, já existe muita coisa pronta na indústria. Com efeito, uma boa parte dessa imprecisão foi resolvida com o posicionamento preciso das máquinas no campo, piloto automático e corte de seções bico a bico, eliminando o problema na sobreposição da aplicação de insumos. Esse tema foi melhor abordado em outros textos escritos nesta coluna e, dessa forma, recomendo a releitura do artigo de dezembro de 2022 sobre o manejo preciso de nematoides.
Acredito que o conhecimento da dinâmica do problema fitossanitário e de técnicas de monitoramento rápido e em larga escala é que tem limitado o avanço da aplicação das técnicas de agricultura de precisão em fitossanidade. Assim, há necessidade de que entomologistas, fitopatologistas, nematologistas e cientistas de plantas daninhas se associem a outros profissionais da engenharia, física, matemática, computação e da própria indústria, para o desenvolvimento de protocolos robustos de detecção e localização rápida dos problemas fitossanitários.
A exemplo disso, foi montado um laboratório de pesquisa em Pompeia/SP, de Monitoramento e Proteção de Plantas (LMMP), fruto da parceria do Governo do Estado de São Paulo, através do Centro Paula Souza, e da Fundação Shunji Nishimura de Tecnologia, em que estão vinculados doutores em Agronomia, Física e Computação com foco no monitoramento dos problemas fitossanitários.
Em plantas daninhas, já é prática de alguns agricultores e prestadores de serviços a aplicação de herbicidas de forma localizada, na catação dessas plantas com drones de pulverização. Há também o uso sensores de barras que detectam as plantas de forma autônoma no campo ligando e desligando a aplicação do herbicida somente sobre o alvo, com economia enorme do defensivo.
No Congresso Brasileiro de Nematologia, em Cuiabá/MT, duas das maiores multinacionais de defensivos lançaram suas plataformas de serviços em agricultura digital para manejo preciso de nematoides. Esse é um tema que estudo desde 2012. Tenho aplicado em algumas consultorias e, agora, mais pessoas irão contribuir para o avanço dessas técnicas. Vale destacar que esses fatos têm batido com as previsões feitas em 2012, de que as técnicas de agricultura de precisão chegariam, primeiro, às plantas daninhas, depois aos nematoides, seguindo para as pragas e doenças.
Sem dúvida, o desenvolvimento tecnológico nos levará a tratamentos fitossanitários mais precisos, considerando as variações espaciais e temporais das pragas, princípio da agricultura de precisão. Mas, ainda temos que lidar com colegas céticos sobre o assunto, presos em técnicas do passado ou outros interesses e que, por serem também influenciadores do campo, só atrasam o desenvolvimento tecnológico da agricultura brasileira.