Milhares de produtores de leite de Santa Catarina estão abandonando a atividade em consequência da excessiva importação de leite e pela queda persistente da remuneração. O novo quadro é tão grave que a Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de SC (FAESC) teme o desaparecimento da agricultura familiar desse segmento da agropecuária “barriga-verde”.
A pedido da FAESC, a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) e outras entidades do setor produtivo participaram recentemente de reunião com o ministro do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar, Paulo Teixeira, para discutir a importação de leite no país.
O vice-presidente da Federação, Enori Barbieri, aponta que o explosivo aumento da importação de leite em pó em 2023 gerou pânico no setor lácteo brasileiro em razão dos impactos na competividade do pequeno e médio produtor de leite.
As importações brasileiras de lácteos de janeiro a maio de 2023 tiveram acréscimo de 212% em relação aos primeiros cinco meses de 2022. Neste ano, o Brasil já importou principalmente da Argentina e do Uruguai, 850 milhões de litros de leite, volume que, no ano passado, foi atingido só em setembro.
O preço do leite no mercado mundial caiu e o Real teve uma relativa valorização frente ao dólar. A associação desses dois fatores estimulou as importações e o preço no mercado interno desabou. Em um primeiro momento, esse movimento é ótimo para o consumidor, que passa a ter produtos lácteos mais baratos. Mas é péssimo para o País, porque pode levar à desorganização e inviabilidade da cadeia produtiva e a consequente expulsão dos pequenos produtores.
A maciça presença de leite importado no mercado interno provocou queda geral de preços, aniquilando a rentabilidade dos criadores de gado leiteiro e também das indústrias de captação, processamento e industrialização de leite.
“Está todo mundo operando no vermelho e a tendência é de nova queda de preços ao consumidor, com mais prejuízo para quem produz. A situação é grave e pode gerar uma nova onda de êxodo rural, como o País já viveu no passado”, adverte o dirigente.
A preocupação da FAESC é procedente em relação ao intenso abandono da atividade leiteira por produtores rurais. Na década de 1990 – de acordo com dados da Secretaria da Agricultura – existiam em território catarinense 75.000 produtores de leite.
O mesmo relatório aponta que a pandemia do novo coronavírus baixou esse contingente, em 2022, para menos de 30.000 produtores. A atual crise teria reduzido ainda mais a base produtiva de pecuária leiteira que estaria, hoje, com apenas 20.000 produtores de leite.
Um fato parece comprovar essa avaliação. A captação de leite cru em território “barriga-verde” caiu mais de 30% neste ano. Os laticínios de Santa Catarina têm, no conjunto, capacidade instalada para processar 13 milhões de litros por dia, mas a captação de matéria-prima não passa de 7,5 milhões de litros/dia.
Já tem indústria ociosa e migrando para outros Estados. O motivo dessa escassez não foi a seca ou o excesso de chuvas, foi a diminuição da população rural empregada nessa atividade. Esse fenômeno leva à mais concentração, favorecendo o surgimento de grandes e médias propriedades, com áreas mecanizadas onde o proprietário consegue plantar o pasto, fazer feno e manter baixos os custos de produção.
Solução para a crise do leite em SC
Regular a importação, criando gatilhos e barreiras para que seu exagero não destrua as cadeias produtivas organizadas existentes no Brasil é uma das soluções que a FAESC propõe, em sintonia com a CNA.
Paralelamente, o presidente da FAESC José Zeferino Pedrozo defende uma política de apoio ao setor que inclua medidas articuladas entre os governos da União e dos Estados para estimular, simultaneamente, a produção e o consumo, abrangendo a redução da tributação, EGF (empréstimos do Governo Federal) para o leite, combate às fraudes, criação de mercado futuro para as principais commodities lácteas, manutenção de medidas antidumping e consolidação da tarifa externa comum em 35% para leite em pó e queijo.
Outras medidas incluem aquisição subsidiada de tanques de resfriamento e outros equipamentos para pequenos e médios produtores, o uso obrigatório de leite e derivados de origem nacional em programas sociais.