Investimento em manejo e sanidade na cria prepara bezerras para alto desempenho em longo prazo
André Pratto
A criação de bezerras e novilhas deve ser encarada como um investimento financeiro, e quem trabalha com fazendas leiteiras sabe que os custos de alimentação e mão de obra são altos e, para repercutirem resultados, podem exigir mais de dois anos até que uma bezerra comece a contribuir de fato na produção de leite.
O planejamento para o futuro de sua fazenda começa com a criação de bezerras e novilhas saudáveis, com um bom desenvolvimento corporal. O número total de novilhas de primeira cria produzido por ano, no rebanho de reposição, tem grande influência na rentabilidade das fazendas de leite, além disso elas são as futuras produtoras. Produtores e técnicos devem ter como objetivo obter novilhas de melhor produção que suas mães. Para que isso ocorra, boas práticas de criação de bezerras, que incluem nutrição, alojamento e saneamento adequados, além da prevenção de doenças e o cuidado diário, são fundamentais.
Os cuidados com as bezerras devem começar já na fase de gestação, mais especificamente com a vaca gestante. Grande parte do crescimento fetal ocorre no seu último terço de gestação, quando aumentam suas exigências metabólicas e fisiológicas. Nesse período, uma dieta balanceada e manejos sanitários adequados são fundamentais para que tenhamos uma vaca apta ao parto e produzindo colostro de ótima qualidade. Nos dois meses que antecedem o parto, algumas vacinas importantes são recomendadas por estimularem a produção de anticorpos passados para as filhas via colostro. Elas contêm antígenos dos agentes causadores de diarreia e pneumonia, virais e bacterianos.
O sucesso da bezerra começa no primeiro dia de vida. Logo após o nascimento, o relógio das primeiras 24 horas começa a contar e cada tomada de decisão e ação vai impactar de forma negativa ou positiva na capacidade produtiva da bezerra em sua futura lactação. Após o primeiro dia de vida, os cuidados e observações diárias dos animais devem continuar. Durante o período do aleitamento e na fase logo após a desmama, temos um maior desafio, com maior incidência de doenças e maiores índices de mortalidade. Conhecer as doenças, a forma de prevenção e como tratá-las é fundamental para o sucesso da atividade.
Problemas de saúde
Os principais problemas de saúde em bezerras na fase de aleitamento são tristeza parasitária bovina, pneumonias e diarreia. Para diminuir a incidência dessas doenças, o primeiro passo é cuidar do ambiente. As bezerras precisam de uma cama profunda, seca e limpa que as mantenha aquecidas e distantes do esterco e da urina. Os equipamentos e utensílios de alimentação precisam estar muito bem higienizados para minimizar a exposição aos organismos causadores de doenças. O bezerreiro deve possuir boa ventilação e não apresentar acúmulo de amônia no ar, com isso minimizamos os riscos de pneumonias. Para bezerras em alojamento em grupo, é preciso ser extremamente vigilante na limpeza do ambiente. Fezes e resto de comida podem se acumular, portanto forneça espaço adequado por bezerra para minimizar sua exposição. Após realizar o famoso “feijão com arroz”, é importante entender sobre cada problema e com isso tomar as melhores decisões para prevenir ou tratar.
Diarreias
As fazendas devem trabalhar com seu veterinário para determinar a melhor prevenção e tratamento para a diarreia em uma fazenda individual. Ao procurar melhorar o gerenciamento dos seus fatores geradores, é importante determinar o tipo de diarreia e a prevalência em seu rebanho. Identificar a idade específica em dias ou semanas de uma bezerra pode fornecer informações importantes sobre o tipo ou a causa. Minimizar a prevalência de diarreia pode melhorar a lucratividade, reduzindo os custos de tratamento e preparando seu rebanho para o sucesso. Melhorar a saúde e o bem-estar das bezerras por meio do controle de doenças também promove o bem-estar dos funcionários da propriedade.
Muitos casos de diarreia não são causados por bactérias, mas sim por nutrição, vírus ou protozoários, tornando ineficazes os tratamentos com antibióticos. Para esses casos, os produtores devem se concentrar na hidratação e nos cuidados de suporte como o melhor tratamento. Para evitar casos futuros, a limpeza precisa ser uma prioridade, além de trabalhar com o veterinário para desenvolver protocolos de vacinação adequados, e uso de medicamentos para metafilaxia.
Para evitar problemas nutricionais, comece com leite puro. O leite integral que foi incorretamente pasteurizado ou resfriado desenvolverá altos níveis de bactérias que podem resultar em diarreia. Se for necessário recorrer a um substituto do leite, escolha o que inclua ingredientes de alta qualidade e quantidades adequadas de lactose.
A diarreia por protozoários é frequentemente causada por Cryptosporidium ou Eimeriose. Devido ao seu ciclo de vida, a coccidiose geralmente ocorre após três semanas de idade e geralmente se parece com manchas cinza-escuras que grudam na cauda, causam dor intensa, absorção reduzida de nutrientes e danos duradouros ao intestino. Esses protozoários podem ser difíceis de gerenciar, pois permanecem no ambiente por longos períodos de tempo. O ideal é manter sempre o ambiente limpo e seco, utilizando produtos para um protocolo de metafilaxia adequado.
Dois agentes virais causadores de diarreia são Coranvirus e Rotavirus, e a transmissão dos dois agentes é do tipo oral/fecal. Os sintomas são diarreia aguda, desidratação, acidose e relutancia para se alimentar. A profilaxia é baseda na vacinação das vacas no período pré-parto, a fim de garantir um colostro com anticorpos para combater estes vírus.
Já as diarreias de origem bacterianas são causadas principalmente por E.coli e Salmonela. Escherichia coli, também conhecida como colibacilose, é um dos agentes etiológicos mais frequentemente isolados em casos de diarreias. No trato gastrointestinal dos animais estão presentes tanto cepas de E. coli que não são patogênicas, quanto cepas patogênicas que causam a diarreia. Na Colibacilose, algumas características podem sugerir que seja uma diarreia por E. coli. Os animais são acometidos já nos primeiros dias vida e as fezes podem apresentar características como: diarreia profusa pastosa ou liquida, e com odor fétido e de coloração amarelada à brancacenta. Além disso, o desenvolvimento da doença de forma aguda pode também ser sinal de uma infecção por Colibacilose.
No caso da Salmonella, a transmissão acontece via oral e pode ocorrer via alimentos, equipamentos, ambiente ou tetos contaminados. Na Salmonella a idade que os animais são mais acometidos geralmente varia entre 2 e 6 semanas, apresentando fezes muito líquidas com vestígios de sangue e febre alta. Os animais rapidamente ficam fracos e desidratados e, se não tratados, morrem de cinco a sete dias após o início da diarreia. Para prevenção dos dois agentes, medidas de higiene e vacinação das vacas são estratégias fundamentais para o controle.
Quanto ao tratamento, a prioridade é manter a bezerra hidratada, uma vez que a desidratação pode ser bastante grave quando uma bezerra está com diarreia e 10% de desidratação (olhos afundados) é uma ameaça à vida do animal. A melhor ferramenta que temos para reidratar bezerras são as soluções eletrolíticas orais. Elas fornecem água, eletrólitos e energia, juntamente com outros fatores que podem promover a absorção no intestino.
Pneumonia
O complexo DRB (doença respiratória bovina) possui etiologia multifatorial e se desenvolve como resultado de interações complexas entre fatores como ambientais, de hospedeiros (estresse/imunidade) e de patógenos (vírus se instalam e facilitam a colonização por bactérias). Nas bezerras, a ocorrência se dá entre 4 e 6 semanas de vida, coincidindo com o momento de menor concentração de anticorpos no sangue. Devido ao decréscimo dos anticorpos da imunidade passiva (adquiridas através do colostro), e o desenvolvimento incompleto do sistema imune próprio da bezerra.
Para prevenir, o colostro novamente tem papel fundamental, aliado a um ambiente limpo, seco e arejado. Nos animais acometidos, o uso de antibióticos com princípio ativo, tilmicosina ou enrofloxacina, associados a um diagnóstico precoce aumenta a chance de sobrevivência das bezerras.
Tristeza parasitária bovina
A Tristeza Parasitária Bovina (TPB) é um complexo de doenças que inclui a Babesiose e a Anaplasmose. Transmitida principalmente pela saliva do carrapato bovino, mas também por insetos hematófagos, pode levar rapidamente o animal à morte. Os agentes causadores da TPB são dois protozoários (Babesia bovis e Babesia bigemina) e uma rickettsia Anaplasma marginale. As babesias são transmitidas aos bovinos única e exclusivamente pelo carrapato Rhipicephalus (Boophilus) microplus. Anaplasma é transmitido pelo carrapato e por insetos hematófagos, como moscas e mutucas.
Normalmente, a maioria dos casos clínicos ocorre entre 90 e 150 dias, idade na qual os animais foram manejados para o piquete coletivo na grande maioria das propriedades. Os sinais clínicos predominantes são anemia hemolítica e a febre, com perda de peso e produtividade em carne e leite, abortos, custos dos tratamentos e morte . Para o tratamento de animais acometidos, temos que entender que muitas vezes não diferenciamos qual agente está causando a tristeza parasitária bovina, por isso é comum associar dois produtos, um para combater a babesiose e outro para anaplasmose. Deste modo, são recomendadas as seguintes orientações terapêuticas:
Babesioses: uso de produtos derivados das Diamidas, como o diaceturato de diminazeno.
Anaplasmose: uso de antibióticos à base de enrofloxacino ou oxitetraciclina.
E dependendo da gravidade dos casos, a transfusão sanguínea associada ao tratamento se torna fundamental para a sobrevivência dos animais. Independentemente de como você analisa os índices e números do seu bezerreiro, investir nas bezerras vale a pena. Os ganhos que você alcança hoje ajudam a prepará-las para um desempenho de longo prazo. Seus lucros futuros dependem do crescimento e desenvolvimento de suas bezerras hoje, afinal o desenvolvimento adequado, incluindo ganho de peso, altura, papilas ruminais e tecido mamário, no início da vida de uma bezerra se traduz em mais produção. E lembre-se que um bom programa de vacinação pode ser uma forma muito eficaz de prevenir diarreia e pneumonias. Porém, se as vacinas para prevenir doenças em bezerras são dadas a vacas secas, certifique-se de que o programa de colostro esteja funcionando para ter sucesso.