A Granja Total Agro entrevistou com exclusividade o doutor Frederico Buss, advogado com atuação especializada no agronegócio e também consultor jurídico da Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul (Farsul). Durante a entrevista, o advogado tratou das questões que envolvem a discussão acerca do Marco Temporal no Congresso e no Supremo Tribunal Federal (STF).
Terras já demarcadas
De acordo com o dr. Frederico, hoje há pouco mais de 517 mil índios, de um total de 897 mil, ocupando uma área de aproximadamente 119,8 milhões de hectares de terras já demarcadas no Brasil. Isso equivale a cerca de 953 hectares para cada família indígena, sendo que a média dos estabelecimentos rurais no Brasil é de 64 hectares.
Para efeitos de comparação, esse espaço (119,8 milhões de hectares) que já é destinado aos índios graças ao Marco Temporal previsto na Constituição Federal de 1988 equivale à soma das áreas totais de Portugal, Inglaterra, Holanda, Espanha, Itália, Irlanda, Bélgica e País de Gales, e ainda sobra espaço. Ocorre, porém, que a população total desses países ultrapassa os 210 milhões de habitantes, que é praticamente o número total de pessoas que vivem no Brasil hoje (213 milhões segundo o IBGE).
Leia mais: Taxa do agro empurra produtor a cobranças judiciais
Caso o Projeto de Lei 490/2007 (PL 490) seja aprovado no Congresso, esse espaço será mantido. Se, porém, o Congresso não o aprovar ou o STF vier a revogar o Marco Temporal, essa área de terras indígenas pode se expandir ainda mais sobre o território nacional, podendo praticamente dobrar de tamanho.
Insegurança jurídica
Hoje, a área destinada aos índios ocupa mais de 14% de todo o território nacional por determinação da Constituição Federal de 1988. Todavia, caso o Marco Temporal seja revogado, dr. Frederico estima que ela possa chegar a um total de 236,93 milhões de hectares (cerca de 27,8% de todo o Brasil). E também alerta para a insegurança jurídica que isso causaria.
Sem a determinação legal de um marco que defina a data para que as terras sejam consideradas posse dos índios – que, hoje, é a de 5 de outubro de 1988 –, tudo poderia ser reivindicado por eles. Conforme pontuou o dr. Frederico durante a entrevista, o próprio ministro do STF Gilmar Mendes afirmou em um processo que até a praia de Copacabana já foi habitada por índios e, portanto, sem o Marco Temporal, tudo poderia ser reivindicado em intermináveis processos. E os problemas vão ainda além.
Direito à propriedade
Segundo o dr. Frederico, a expropriação de terras para a demarcação destinada aos índios fere frontalmente o direito fundamental à propriedade privada. Isto ocorre devido às famílias que vivem em locais nos quais a Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) demarca como sendo terras indígenas serem expulsas de suas casas, perderem as terras de onde conseguem o seu sustento e, ainda, não possuírem amparo legal com base na Constituição para serem indenizadas pelo valor de seus imóveis e terras, mas somente pela benfeitorias neles realizadas. E, de acordo com ele, quase sempre as terras demarcadas, ao menos no Estado do Rio Grande do Sul, são terras tituladas e cujos títulos de posse foram outorgados pelo próprio Estado no começo do século XX, tendo sido colonizadas de forma pacífica, sem o desalojamento de índios, pois estes tiveram as suas terras preservadas.
Ele também afirma que cerca de 3.500 famílias de agricultores já foram negativamente impactadas pelas demarcações somente no Estado do Rio Grande do Sul, sendo a maior parte delas composta por pequenos agricultores, muitos dos quais já estão há mais de cem anos assentados em suas terras, seja porque seus antepassados – pais e avós – compraram os títulos de propriedade entre os anos de 1910 e 1920, seja porque fizeram a compra das terras de quem lá já vivia ao longo das décadas seguintes. E mais: não se tratam apenas de famílias cuja única fonte de renda são as suas terras, mas comunidades inteiras – com salão paroquial, áreas de lazer, cemitérios – que seriam desalojadas.
Portanto, conforme afirma o dr. Frederico, ao revogar o Marco Temporal o STF estaria afirmando que o os direitos dos índios valem mais do que os direitos dos produtores rurais. E isso ocorreria pois o direito à propriedade destes seria suprimido em função de se conceder ainda mais terras para os índios.
E mais: dr. Frederico afirma que as demarcações chegariam até mesmo às áreas urbanas, como já está ocorrendo no município de Vicente Dutra/RS. De acordo com o advogado, a demarcação homologada por Lula no local atinge 200 casas situadas em zona urbana, além de 70 propriedades rurais.
Impactos no agro
Dr. Frederico também apresentou dados referentes a um relatório da Confederação da Agricultura e Pecuária no Brasil (CNA) que versa sobre a “Segurança Jurídica na Demarcação de Terras Indígenas” no país. De acordo com o relatório, caso o Marco Temporal seja revogado pelo STF, isso impactaria diretamente o agronegócio brasileiro. Confira abaixo:
Desemprego: estima-se que cerca de 1,5 milhão de empregos seriam extintos no campo;
Inflação: o preço dos alimentos sofreria um aumento significativo em todo o Brasil;
Produção: R$ 364,59 bilhões em produtos agrícolas deixariam de ser produzidos no país;
Exportação: US$ 42,73 bilhões em exportações agrícolas deixariam de ser gerados.
Veja também: CPI do MST realiza primeira visita
PL 490
Conforme outro relatório da CNA, esse versando acerca do PL 490, também apresentado pelo dr. Frederico, a aprovação desse projeto de lei sobre o “Marco Temporal na Demarcação de Terras Indígenas” seria muito benéfica para a sociedade, assegurando “plenitude de segurança jurídica a todos que vivem no campo”. E isto se daria porque a sua votação favorável na Câmara e, posteriormente, no Senado tornaria “legislação essas regras e princípios fixados pelo STF” em 2009 e que correm o risco de serem revogados no novo processo sobre o tema que deve ser retomado no próximo dia 07 e que ocorre em paralelo à tramitação no Congresso do PL 490. Confira os benefícios elencados pelo relatório:
Transparência no processo demarcatório;
Vedação da ampliação de terras indígenas já demarcadas;
Necessidade de participação dos entes federados nas demarcações; Proibição de cobrança de tarifas pelo ingresso, trânsito ou permanência autorizada de não-índios em suas terras.